Revista Jurídica Cajamarca |
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Riscos ocupacionais da equipe de saúde – aspectos éticos e legais (*)Genival Veloso de França (**) |
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Os
profissionais de saúde, como os demais trabalhadores, estão sujeitos
aos riscos profissionais genérico, específico e genérico agravado e,
portanto, expostos aos acidentes do trabalho, às doenças profissionais
e às doenças do trabalho. Sendo
assim, além do acidente-tipo, pode-se dizer que eles estão expostos às
doenças profissionais, ou seja, àquelas que são inerentes ao
desempenho de suas atividades loborais, que se apresentam como síndrome
típica em outros trabalhadores de mesma situação, que têm um fator
etiológico conhecido e que
estão relacionadas em ato do Ministério da Previdência Social. Estão
sujeitos também às chamadas doenças do trabalho, tidas como aquelas
provenientes de certas condições especiais que determinado tipo de
trabalho venha sendo realizado e, por isso, rotuladas de doenças
“indiretamente profissionais”. Na prática, nem sempre é fácil
fazer essa diferença. Sendo
assim, essas categorias profissionais estão adstritas principalmente
a três tipos de doenças profissionais e do trabalho: 1.
doenças infecciosas e parasitárias; 2.
dermatites por contato; 3.
enfermidades decorrentes de radiações ionizantes; 4.
enfermidades por gases irrespiráveis; 5.
enfermidades por vícios ergonômicos. As doenças
profissionais ou do trabalho, embora de caráter insidioso, algumas
delas, como por exemplo, as doenças infecciosas e parasitárias, pela
forma brusca de instalação, podem ser caracterizadas como acidentes de
trabalho. Mesmo
que certos agentes biológicos patógenos se localizem de preferência
no ambiente de trabalho hospitalar ou ambulatorial, existentes nos
pacientes ou em certos materiais contaminados que determinam processos
infeciosos variados, há quem conteste tais possibilidades alegando a
incerteza da prova do nexo etiológico ou afirmando que são de ocorrências
raras e não acometem todos os que exercem ali suas atividades. Dentre
todas essas enfermidades infecciosas, a transmissão ocupacional do HIV
e dos vírus das hepatites A e B, pelo seu caráter dramático e grave,
exige não só a sua inclusão dentro do acidente-tipo, mas que se
estabeleçam, a partir do próprio local de trabalho, rotinas e cuidados
rigorosos para prevenir a infecção e, ao mesmo tempo, nos casos de
acidente com material contaminado, estabelecer o uso da quimioprofilaxia
precoce. Por esta razão, os hospitais e ambulatórios devem manter em
estoque esses medicamentos para uso imediato. Entendemos
que os acidentes de trabalho com sangue e outros materiais contaminados
devem ser tratados como emergência médica, principalmente no que diz
respeito à infecção pelo HIV e hepatite B, pois a intervenção no
sentido de suas profilaxias deve iniciar-se imediatamente após a ocorrência
do fato, mesmo tendo-se a consciência de que essas medidas não são
totalmente eficazes. Daí a necessidade de se adequar de forma rigorosa
todas as medidas de prevenção para evitar o problema da infecção. A
probabilidade de infecção pelo vírus da hepatite B após exposição
percuitânea é muito alta, chegando atingir 40% dos casos em que o
paciente-fonte apresenta sorologia reativa. Por isso recomenda-se para
todos os profissionais de saúde expostos ao contato com material biológico,
o uso da vacina para hepatite B associada ou não à hemoglobulina
hiperimune. O mesmo não se dá com a hepatite C, pois não existe ainda
uma forma específica de prevenir a sua transmissão após contaminação
ocupacional. Recomenda-se
também que na assistência de todos
os pacientes onde se manipula sangue,
secreções, excreções, mucosas e pele não-íntegra, faça-se o uso
de equipamentos de proteção individual (máscaras, gorros, óculos de
proteção, luvas, capotes e botas) e os cuidados com materiais pérfuro-cortantes,
mesmo os estéreis. Nos
casos de probabilidade de contaminação pelo HIV deve-se considerar
como paciente-fonte não infectado aquele que apresenta documentação
recente de exames anti-HIV negativos e que não tenha nenhuma evidência
clínica de infecção aguda. Devem ser considerados materiais biológicos
sem risco de transmissão ocupacional
do HIV o suor, lágrima, fezes, urina e saliva, exceto na prática
odontológica. A pele íntegra também não é considerada material de
risco de transmissão. Todo paciente poliferido com sorologia anti-HIV
desconhecida é uma possibilidade de risco, levando-se em conta
principalmente a gravidade do acidente
e a origem do material biológico manipulado. Aspectos
éticos O Código
de Ética Médica vigente no artigo 11 de seus Princípios Fundamentais
inicia uma série de considerações sobre a relação no trabalho,
quando assegura que o médico deve manter sigilo quanto às informações
confidenciais que tiver conhecimento no exercício de suas atividades,
aplicando-se isso também aos que trabalham em empresas publicas ou
privadas. É mais
enfático no artigo 12 quando se reporta à necessidade de o médico
buscar uma melhor adequação nas condições de trabalho com a eliminação
ou controle dos riscos inerentes a cada atividade laborativa. É
claro que, sendo médico um agente indispensável nas ações de saúde
envolvendo a relação de trabalho, não poderia ficar indiferente às
propostas que defendem a saúde do trabalhador a partir do seu próprio
lugar de trabalho. Não é exagero falar-se de “saúde do
trabalhador”, hoje ainda muito limitada ao ambiente fabril, mas que
necessita de uma abordagem mais profunda no seu aspecto cultural e sócio-econômico,
capaz de condicionar melhores níveis de vida e de saúde em favor da
classe obreira. A
sociedade também não deve incentivar o trabalhador na troca de sua saúde
pelo pagamento de percentuais de insalubridade e periculosidade, como
alternativa mais barata e que isenta o patronato de maiores
investimentos na melhoria das condições ambientais de trabalho. Essa
premiação perniciosa do risco é lesiva aos interesses de todos. Por
isso é importante que se incentivem as informações aos trabalhadores
por profissionais especializados sobre
as condições de trabalho, sobre suas doenças mais comuns e sobre o
controle de riscos de cada setor laboral. Quanto
ao artigo 14 deste Código, ao se enunciar que o médico deve
empenhar-se para melhorar as condições de saúde e os padrões dos
serviços médicos, assumindo assim uma parcela de responsabilidade em
relação à saúde pública, à educação sanitária e à legislação
referente à saúde, outra coisa não
aplaude senão um projeto mais sensível em busca das responsabilidades
sociais que se espera desta profissão. No Capítulo
da Responsabilidade Profissional, artigo 40, o Código de Ética se
expressa claramente desaconselhando o médico deixar de esclarecer o
trabalhador sobre as condições de trabalho que ponham em risco sua saúde.
Mesmo sabendo-se que pela legislação muitas dessas atribuições são
dos fiscais do Ministério do Trabalho e dos Membros das Comissões
Internas de Proteção de Acidentes, do Departamento Nacional de Segurança
e Higiene do Trabalho e das lideranças dos trabalhadores
sindicalizados, o médico não pode deixar de esclarecer os
trabalhadores sobre os riscos de vida e saúde e de denunciar esses
fatos às autoridades competentes. Não se concebe que as propostas de
saúde ocupacional não estejam integradas no seu todo, no que se refere
aos seus planos, programas e atividades, às
ações dos serviços assistenciais de saúde, quando da avaliação
dos fatores ambientais e biológicos. Finalmente
o artigo 41 diz textualmente que é vedado ao médico deixar de
esclarecer o paciente sobre as determinantes sociais, ambientais ou
profissionais de sua doença. Isto porque para se conquistar a saúde não
basta modificar a relação entre o homem e a natureza, mas, também, no
sentido de mudar as relações sociais e do trabalho. No
entanto, no que diz respeito às condições ligadas a riscos
ocupacionais do trabalho do próprio médico o nosso Código é omisso,
lembrando apenas no Capítulo dos chamados Direitos dos Médicos, artigo
23, que ele tem o direito de recusar-se a exercer sua profissão em
instituição pública ou privada onde as condições de trabalho não
sejam dignas ou possam prejudicar o paciente. Ainda assim, como se vê,
tal dispositivo se volta muito mais para as instituições de saúde que
não apresentem as mínimas condições de exercício da profissão. Aspectos
legais. Mesmo
que nem todos os profissionais de saúde estejam na categoria de
trabalhadores regidos pela CLT, todos os acidentados, inclusive os
sujeitos ao Regime Jurídico Único
dos Funcionários da União, dos Estados e dos Municípios devem ser
devidamente notificados em setores competentes. Os
empregados em empresas privadas, quando acidentados, devem ser
comunicados seus acidentes em formulário próprio, denominado CAT -
Comunicação de Acidente de Trabalho, em 24
horas. Os empregados no serviço público, a prova do acidente
será feita no prazo de 10 dias, improrrogável quando as circunstâncias
o exigirem, conforme recomenda o artigo 214 da Lei n.º 8.112, de 11 de
dezembro de 1990, que trata do Regime Jurídico dos Servidores Civis públicos
da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais.
No que se refere aos funcionários públicos dos Estados e Municípios
observam-se especificamente cada situação prevista em seus Regimes Jurídicos.
A
legislação trabalhista, em suas normas regulamentadoras, recomenda a
disponibilidade de medicamentos para a profilaxia, a vacina para hepatite B e a
gamaglobulina hioperimune nos locais de trabalho e o Regime Jurídico Único
dos Funcionários da União, em seu artigo 213 diz textualmente que “o
servidor acidentado em serviço que
necessite de tratamento especializado poderá ser tratado em instituição
privada, a conta de recursos públicos. No
registro do acidente de trabalho deve constar sempre as condições do acidente (data, hora, tipo de exposição, área
corporal atingida, material biológico envolvido na exposição,
utilização ou não do equipamento de proteção individual pelo
profissional de saúde, avaliação do risco-gravidade do acidente,
local e causas do acidente), os dados do paciente fonte (identificação, dados sorológicos e/ou
virológicos e dados clínicos), os
dados do profissional de saúde (identificação, ocupação,
idade, data de coleta e os resultados de exames laboratoriais, uso ou
não de medicamentos anti-retrovirais, uso ou não de hemoglobunina
hiperimune e vacina para hepatite B, uso de medicação
imunossupressora ou história de doença imunossupressora), a
conduta indicada após o acidente, o planejamento assistencial e o
nome do responsável pela condução do caso.
(*) Trabalho apresentado na Mesa Redonda “Riscos Ocupacionais da Equipe Médica”, no XX Congresso da Associação Médica Fluminense, Niterói, 10 a 14 de agosto de 1999. (**) Professor de Medicina Legal da Escola Superior da Magistratura da Paraíba. |
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